Pescadores entregarão no Congresso Nacional Proposta de Projeto de Lei
Popular para regulamentar o Território Pesqueiro
Configurado como o maior desastre ambiental do litoral brasileiro, o
óleo cru que tem atingido a costa brasileira desde o final de agosto, já
contaminou mais de 490 localidades de 10 estados, segundo o IBAMA. Neste final
de semana chegou ao Delta do Parnaíba, único em mar aberto das Américas. Uma
situação que, assim como em todo o nordeste e outras regiões que já estão
contaminadas (já chegou ao Espírito Santo), afeta diretamente a vida dos
pescadores e pescadoras, marisqueiras e caranguejeiros, que sobrevivem quase
que exclusivamente deste recurso. Uma situação que, impactando os ambientes e
ecossistemas marinhos, desestrutura a vida das pessoas e suas comunidades, o
turismo e a economia local.
A situação do óleo
no litoral brasileiro será, até pela urgência de soluções, uma das mais
importantes pautas dos mais de 300 pescadores e pescadores artesanais que
estarão em Audiência Pública na Comissão de Legislação Participativa (CLP) do
Congresso Nacional, dia 21, às 09h00, no Plenário II. O evento marca o Grito da
Pesca Artesanal 2019, data em que os pescadores e pescadoras artesanais
realizam mobilizações em favor dos povos das águas, em todo o Território
Nacional.
Delegações vindas
de todas as regiões do Brasil chegarão à Brasília para expor e reivindicar dos
parlamentares e governo federal, a defesa de seus territórios pesqueiros. Nos
últimos anos, o Movimento Nacional de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP)
coletou assinaturas em apoio para um Projeto de Lei em defesa do seu
território. Agora, será o momento de entregar o Projeto de Lei como uma
sugestão legislativa, na Comissão.
Além dos
parlamentares da CLP, a Mesa de Abertura da Audiência contará com a
participação do professor Cristiano Ramalho, da Universidade Federal de
Pernambuco; Dom Frei Leonardo Ulrich Steiner, bispo auxiliar da Arquidiocese de
Brasília; Josemar Durães, pescador e coordenador nacional do MPP e Maria Eliene
Pereira do Vale, representante da Articulação Nacional das Pescadoras
Artesanais.
À realidade do
crime socioambiental ocasionado pelo óleo nas praias e sofrido pelas
comunidades do litoral brasileiro nos últimos meses, somam-se as ameaças
trazidas pela aquicultura empresarial e grandes empreendimentos que se
estabelecem nos territórios pesqueiros sem, ao menos, consultar os pescadores e
pescadoras artesanais. Essa realidade levou os homens e mulheres das águas à se
mobilizarem em conjunto com parceiros da Universidade e da sociedade civil
organizada, para iniciarem há sete anos uma campanha de coleta de assinaturas
em favor da criação de um marco legal que garanta a permanência dessas
populações nos seus territórios de pesca à beira dos rios, mares e lagoas.
Desmonte da
regulamentação da profissão de pescador artesanal
Entre as demais
pautas que o MPP apresentará no Congresso, e também para o Ministério Público
Federal (MPF), em Plenária sobre Violações Socioambientais em Comunidades
Tradicionais Pesqueiras que acontece no auditório L4 da Procuradoria Geral da
República (PGR), dia 22 às 09h30, estão as denúncias de desmontes da
regulamentação da profissão pelo atual governo. Um exemplo claro dessa
estratégia é o recadastramento nacional dos pescadores e pescadoras que a
Secretaria da Pesca está propondo. A pescadora Josana Pinto Costa, do Pará,
explica que a secretaria está realizando “videoconferências com os pescadores
dos estados e dizendo que a manutenção do Registro Geral da Atividade Pesqueira
(RGP) será mensal, ou seja, todo mês o pescador deverá se recadastrar para não
perder sua carteira profissional”. Atualmente, o recadastramento é anual.
Para Josana, “eles
estão encontrando formas para, de fato, acabar com os direitos dos pescadores e
pescadoras artesanais”. Como moradora da Amazônia (município de Óbidos, no
Pará), Josana conhece a dificuldade em ir até a sede do município todo mês. “É
inviável. Em determinadas regiões, não tem como os pescadores chegarem até a
sede do sindicato, da Colônia ou da sua associação, muito menos na Secretaria
da Pesca para fazer a manutenção do seu RGP todo mês”, explica Josana,
indignada. “Queremos e precisamos denunciar as atrocidades que estão
acontecendo em nossos territórios”.
Dona Celeste Souza,
moradora do Delta do Parnaíba há 64 anos, conhece de perto as dificuldades que
os pescadores enfrentam para terem a sua profissão reconhecida pelo Estado. Ela
recebeu seu Registro Profissional como pescadora em 1982, há apenas 37 anos,
apesar de ter começado a pescar com 8 anos de idade. Dona Celeste detém
conhecimentos tradicionais profundos sobre os ecossistemas e suas modificações
com o decorrer do tempo. Além das dificuldades para a regulamentação
profissional, algo mais grave tem preocupado a pescadora recentemente: a
contaminação do Delta da Parnaíba pelo óleo, que na opinião dela, é o início do
“extermínio” dessas populações, pois em sua história não tinha visto nada
igual: “É uma situação extremamente grave na história do Piauí. Nenhuma
modificação na natureza desse tipo eu tinha visto. O problema é que óleo já
entrou na água doce. Das quatro bocas da Barra do Delta, ele já está no Porto
dos Tatus. E se entrou no Delta e predominou na água doce, é a destruição das
marisqueiras que sobrevivem da extração do marisco, do camarão e dos peixes da
região. Nesse momento, os pescadores e marisqueiras choram o extermínio de suas
vidas e a sobrevivência no Delta do Parnaíba. É extremamente cruel a situação”,
relata emocionada a pescadora.
Sobre o Grito da
Pesca Artesanal
Desde o ano 2004,
os pescadores e pescadoras artesanais do Brasil realizam, no dia 21 de
novembro, o Grito da Pesca Artesanal. Na data, são feitas mobilizações
nacionais em favor dos povos das águas. A escolha da data faz referência à
Revolta da Chibata, acontecida na cidade do Rio de Janeiro, no ano de 1910,
quando marinheiros afro-brasileiros, que originalmente eram pescadores, fizeram
um motim contra as chibatadas que recebiam dos oficiais brancos da
marinha.
Serviço
O quê: Audiência
Pública para entrega do Projeto de Lei em Favor do Território Pesqueiro
Onde: Plenário II
da Câmara dos Deputados, no Anexo II
Quando: 21 de novembro de 2019, às 9:00hs.
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