quarta-feira, 20 de novembro de 2024

13º Grito da Pesca Artesanal: um barco de lutas e conquistas navega por Brasília

Primeiro dia é marcado por debates, dados alarmantes e uma grande mobilização, o evento reúne pescadores e pescadoras de todo o Brasil para exigir justiça climática, soberania alimentar e políticas públicas para a pesca artesanal

Por: Henrique Cavalheiro 

Foto: Ademas da Costa
O 13º Grito da Pesca Artesanal começou nesta quarta-feira (20), em Brasília, com a participação de pescadores e pescadoras artesanais de 18 estados, promovido pelo Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais do Brasil (MPP).

O 1º dia do evento foi marcado por uma acolhida calorosa e uma mística de abertura coordenada pela pescadora Ana Ilda e pelo pescador Florivaldo, fortalecendo o espírito de luta coletiva. Durante a tarde, foram apresentados os principais informes e pontos da programação. O dia também contou com o lançamento de dados preliminares do Relatório de Conflitos Socioambientais em comunidades pesqueiras, seguido por uma Feira dos Territórios, que trouxe cultura e integração entre os participantes. 

Ocorreu também a participação de delegações internacionais, com representantes de mais de 40 países que participaram da 8ª Assembleia do Fórum Mundial de Povos Pescadores (WFFP), realizada em Brasília. Essa troca global fortaleceu a conexão entre as lutas locais e internacionais, ampliando o alcance das reivindicações por justiça climática, soberania alimentar e direitos territoriais. A participação dos povos das águas de diferentes partes do mundo trouxe diversidade ao debate e reforçou a importância da solidariedade internacional na defesa das comunidades pesqueiras e do meio ambiente.

Racismo ambiental e ameaças constantes 

Foto: Comunicação MPP
Andrea Rocha, secretária de Território e Meio Ambiente do Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (CPP), apresentou os dados preliminares do Relatório de Conflitos Socioambientais em comunidades pesqueiras, destacando a importância simbólica de fazê-lo no Dia da Consciência Negra. 

“Esse espaço é simbólico de luta, que traz a memória do quilombo de Palmares e da resistência liderada por João Cândido, o Almirante Negro. Esses dados reforçam o que já ouvimos das comunidades: o racismo ambiental e as ameaças constantes ao território pesqueiro, causadas pelo capitalismo e pelos grandes empreendimentos”, afirmou Andrea. Ela destacou que as ameaças colocam em risco não apenas as comunidades pesqueiras, mas também os ecossistemas protegidos por esses povos.

Sublinhou que o relatório vai além da denúncia, registrando as experiências de resistência das comunidades. “Assim como Palmares e a Revolta da Chibata, os pescadores e pescadoras reafirmam sua posição como guardiões e guardiãs dos territórios pesqueiros, patrimônio de todos nós, da sociedade brasileira. Esses dados são preocupantes, mas ao mesmo tempo reforçam a importância da luta coletiva e da resistência histórica das comunidades pesqueiras”, concluiu, ressaltando o papel fundamental desses povos na proteção do meio ambiente e na garantia de direitos para as futuras gerações. 

O Relatório de Conflitos Socioambientais Pesqueiros será oficialmente lançado em 2025, abrangendo todo o território nacional e destacando as realidades específicas de cada região. 

Estratégia de invisibilização

Foto: Ademas da Costa
Representando o MPP-Rio Grande do Sul, a pescadora Viviane Machado Alves, compartilhou os desafios enfrentados por sua comunidade, que foi gravemente impactada pelas enchentes de 2023 e 2024. Viviane destacou a falta de políticas públicas como parte de uma estratégia de invisibilização da pesca artesanal na região da Lagoa dos Patos, que abriga cerca de 20 mil pescadores. “O governo do estado diz que nossa lagoa é inutilizada enquanto seguimos sofrendo com impactos de mineração, fechamento da Boca da Barra e agora as enchentes. Essa invisibilidade é planejada, porque, ao negar políticas públicas para nós, querem afirmar que ali não existem pescadores”, denunciou.

Viviane ressaltou ainda a importância do Grito da Pesca Artesanal como um espaço para trazer visibilidade às lutas e impactos vividos pelas comunidades pesqueiras. “Estarmos aqui, enquanto pescadores do Rio Grande do Sul, é fundamental para mostrar o que aconteceu e continua acontecendo no nosso estado. Esse espaço de fala e escuta é importante porque, na realidade, todos nós, do Brasil inteiro, estamos sendo impactados. A luta continua, e não vamos permitir que o capitalismo avance sobre nossos territórios. Vamos lutar até o fim para defender nossa Lagoa dos Patos”, concluiu. 

Barco de conflitos, mas também de conquistas

Foto: Ademas da Costa

A integrante da coordenação do MPP-Brasil, Ana Ilda, celebrou o sucesso da abertura do evento, destacando os desafios enfrentados para a realização da mobilização. “Foi uma abertura esplêndida, onde conseguimos apresentar o caderno de conflitos com dados alarmantes e ouvir as falas impactantes dos pescadores e pescadoras que trouxeram a realidade de suas comunidades. Essas falas nos fazem refletir e nos dão ainda mais força para continuar esse Grito. A nossa luta não é só por nós, mas por todos os pescadores de todas as regiões e até de outros continentes”, afirmou, destacando a conexão com a 8ª Assembleia do Fórum Mundial dos Povos Pescadores.

Ana Ilda também destacou o caráter histórico deste Grito, que reúne mais de 800 participantes de todo o Brasil. “Hoje é um momento histórico, porque encerramos a Assembleia Mundial e iniciamos o 13º Grito da Pesca. Estamos todos juntos nesse grande barco, um barco de conflitos, mas também de conquistas”, declarou. Para Ana, o evento reforça a união e a resistência dos pescadores e pescadoras na defesa de seus direitos e territórios.

Foto: Comunicação MPP
O 13º Grito da Pesca Artesanal segue até a próxima sexta-feira, dia 22, com uma programação repleta de debates e atividades. Na manhã desta quinta-feira (21), pescadores e pescadoras artesanais de todo o Brasil tomarão as ruas de Brasília na grande Marcha do Grito da Pesca 2024, a partir das 8h30, com concentração no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, no Eixo Monumental, levando as pautas e reivindicações da pesca artesanal à capital federal. A mobilização promete reforçar a luta por justiça climática, soberania alimentar e políticas públicas que garantam os direitos e territórios das comunidades pesqueiras.


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