quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Povos e comunidades tradicionais ocupam Palácio do Planalto

Ousados e destemidos, os protestos do Grito da Pesca artesanal, de 2016, foram iniciados com uma ação radical: a ocupação do pátio frontal do Palácio do Planalto. Acompanhados por índios, quilombolas e quebradeiras de coco, os pescadores e pescadoras entraram rapidamente no Palácio, na manhã do dia 22 de novembro. A ação rápida não permitiu que os seguranças impedissem o acesso dos cerca de 500 manifestantes ao prédio.  

Durante quase cinco horas, os manifestantes dançaram torés, cantaram sambas e protestaram contra os projetos de lei que afetam aos povos e comunidades tradicionais. “A gente pode dizer que é um momento singular para o Movimento dos Pescadores e Pescadoras, porque a gente tem uma diversidade de outros povos originários, de quilombolas de vários estados do Brasil. Nós estamos também com uma boa representação, mostrando assim um caminho a ser consolidado, numa unidade dos povos e comunidades tradicionais do Brasil na luta por direitos, por território e por uma vida melhor”, explica o pescador João Batista dos Santos, liderança de Tatajuba (CE).

Em nota, os povos apontaram as razões da ocupação, entre elas a PEC 55, que representa para os manifestantes a intensificação do processo de sucateamento de políticas públicas para efetivação de direitos fundamentais. Os protestos contra a PEC 215, a PEC 65, a PL 1610 e a PL Terras estrangeiras também foram expostos na nota, pelos povos, por entenderem que são mecanismos criados para expropriação dos territórios tradicionais para implantação de grandes projetos do agro – hidronegócio, mineração, produção de energia e monocultivos. 

Entre as pautas específicas dos pescadores estava a reivindicação da suspensão dos cancelamentos dos Registros Gerais de Pesca (RGP) e a revogação dos Decretos 8424 e 8425, por violarem os direitos das pescadoras e pescadores artesanais.

Os manifestantes saíram do Palácio apenas depois que foi acordada uma reunião de 30 representantes dos povos com os ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, da Saúde, Ricardo Barros, da Segurança institucional, Sérgio Etchegoyen, da Justiça, Alexandre de Moraes e o então ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, que viria a pedir demissão três dias após a ocupação do Palácio, devido ao escândalo político envolvendo o seu nome.

As conversas com os ministros, no entanto, não foram animadoras. “Como a gente previa o curso da reunião não foi bom. Os ministros chegaram com pouca disposição de ouvir e fazer encaminhamentos concretos, no sentido de reverter as questões que estávamos colocando como centrais, como: reverter o decreto 8424 e 8425 ou construir coletivamente estratégias de incidência sobre  esses instrumentos. Também pautamos que as carteiras suspensas e canceladas, por ausência de gestão, deveriam ser descanceladas e a suspensão deveria ser revista”, explica a liderança do MPP de Salinas da Margarida, Elionice Sacramento.

Para Elionice e outras lideranças que participaram da reunião, ficou claro que o governo não está aberto para o diálogo. “Saímos de lá constatando efetivamente aquilo que a gente já sabe: de que esse é um governo que não está disposto a atender os povos e comunidades tradicionais e suas demandas. Ficou mais claro que não dá para fazer meras negociatas sem um processo de incidência e de pressão forte”, reflete.

A mesma opinião é compartilhada pela liderança indígena do povo Gamela do Maranhão, Cuntum Gamela. “A conversa com os ministros do governo foi lamentável. De certo modo já se esperava isso. Os rumos desse Estado, desses governos têm sido sempre o mesmo: priorizar o agronegócio da soja, da cana, do eucalipto, da mineração. Hoje, avançando sobre os territórios pesqueiros, comunidades tradicionais, enfim, é o mesmo rumo de sempre do Estado brasileiro, nunca mudou. Desde o início da colonização até hoje é o mesmo Estado”, finaliza.


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