quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Carta aberta dos povos do São Francisco

CARTA ABERTA DOS POVOS DO SÃO FRANCISCO

Foto: Méle Dornelas / CPP Nacional
“Crescemos a pensar que éramos seus proprietários e dominadores, autorizados a saqueá-la. Por isso, entre os pobres mais abandonados e maltratados, conta-se a nossa terra oprimida e devastada, que «geme e sofre as dores do parto» (Rm 8, 22). Esquecemo-nos de que nós mesmos somos terra (cf. Gn 2, 7). O nosso corpo é constituído pelos elementos do planeta; o seu ar permite-nos respirar, e a sua água vivifica-nos e restaura-nos.” (Papa Francisco, Laudato Si’)

Nós, Povos indígenas, de terreiros, ciganos e comunidades pesqueiras, quilombolas,  rizicultoras, ribeirinhas e vazanteiras, movimentos sociais e estudantis, educadores, entidades populares, pastorais, sindicatos, associações, colônias, ONGs,  mobilizados no “Grito em Defesa do Rio São Francisco” realizado em Propriá-SE, região do Baixo São Francisco, manifestamos nossa profunda indignação com a grave situação socioambiental que se encontra o Rio São Francisco, especialmente em relação aos fortes impactos causados pelas barragens, bem como pelo controle da vazão voltado para atender os interesses do agronegócio, da indústria da seca e da matriz energética descomprometida com a biodiversidade, e com a reprodução física e cultural dos povos e comunidades tradicionais da região.

No contexto do 27º aniversário da Constituição Federal nos unimos a Semana Nacional de Mobilização dos Povos e Comunidades Tradicionais e na Bacia do Rio São Francisco defendemos os direitos desses povos conquistados com muita luta. Denunciamos as estratégias das três esferas do estado brasileiro (Congresso Nacional, Governo Federal e poder judiciário) que visam retroceder os direitos humanos, sociais, ambientais, econômicos, espirituais e culturais favorecendo o avanço dos grandes projetos econômicos sob os territórios tradicionais.

É de conhecimento público que na região do Baixo São Francisco a baixa vazão tem provocado o desaparecimento das lagoas marginais, a diminuição de quantidade, qualidade e extinção de espécies da fauna e da flora, o assoreamento do rio, que tem como consequência o avanço do mar, alterando significativamente as características do ecossistema e os modos de fazer, viver e de reprodução das populações locais. Consideramos a Chesf como a principal responsável por essa grave situação.

Além disso, denunciamos o avanço dos grandes empreendimentos turísticos, petrolíferos, de piscicultura e carcinicultura, bem como o avanço do latifúndio (monocultivo da cana-de-açúcar, do arroz) e a intensiva utilização de agrotóxicos nocivos à saúde e ao meio ambiente pelo agronegócio. Consideramos a Codevasf, a Petrobrás, a indústria da aquicultura e do turismo de massa como as principais responsáveis por essas situações. Combatemos os discursos preconceituosos, do governo do estado e de setores da aquicultura, que visam descaracterizar o modo de vida e a identidade do pescador e pescadora artesanais, para prevalecer os interesses dos empresários da carcinicultura e tilapicultura.

Dessa forma:
§  Reforçamos nossa luta em defesa dos direitos e dos territórios dos povos e comunidades tradicionais;
§  Exigimos a efetivação e ampliação dos direitos humanos, sociais, ambientais, econômicos, espirituais e culturais dos povos e comunidades tracionais;
§  Exigimos a imediata regularização fundiária dos territórios indígenas, quilombolas, pesqueiros, terreiros, ciganos e vazanteiros, bem como uma efetiva reforma agrária popular;
§  Exigimos uma real revitalização da bacia como forma de garantir a biodiversidade e o modo de vida dos povos e do Rio São Francisco.

Continuaremos envoltos da mística do Velho Chico, com toda a sua beleza e biodiversidade. Seguiremos firmes na luta em defesa das águas, das terras, dos povos e territórios livres.

Propriá, Sergipe, 7 de outubro de 2015.

ASSINAM REPRESENTANTES DAS SEGUINTES ENTIDADES E OUTRAS...
- Comunidades Quilombolas, Assentamentos Agrários, MST, MPA, MPP, Colônias de Pescadores Artesanais, Articulação Popular São Francisco Vivo, CPP, Cáritas Diocesana de Propriá, SINTESE (Professores e Estudantes), Pastoral da Juventude Rural, Sindicatos, SINDISERV de Propriá, STTR’s, Pólo Sindical do Baixo São Francisco, , Escolas das redes públicas de ensino, Diocese de Propriá, Associações, ONG Carranca, AGENDHA, MMC e outras.



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